29.7.09

Beleza



Acordou. Aquele primeiro segundo soube-lhe a um dia como tantos outros. Mas rapidamente se apercebeu que seria diferente. A rotina havia mudado, novamente. Então, os pensamentos que brotavam constantemente dentro de si, de todo o lado, desapareceram. O ar já não era vazio. Estava preenchido por um cheiro familiar. Um cheiro aprazível e leve. Emanava dela. Chamava-o.
Aproximou a cara do pescoço dela. Ainda a dormir, não havia dado pela presença dele. Cheirou-a com meiguice, deixando-lhe um beijo humilde, ainda que longo no elegante pescoço. Voltou a encostar a cabeça à almofada e encostou-se a ela, com um braço infiltrado no seu peito, sentindo-lhe o coração a pulsar. Batia forte contra o peito dela, num ritmo calmo. Este palpitar enchia-o. Marcava-lhe o ritmo à vida. Emergia-o num arrepio incontrolável – porque não o queria controlar, porque era tão irresistível, porque era tão completo –, um arrepio eléctrico e fulminante, que a cada batida do seu coração se repetia e repetia, sempre com a intensidade de um choro feliz.
Assim repousou durante longos momentos, à beira do sono. Não reparou quanto tempo assim ficou (se alguns minutos ou quase uma hora – ou mais). Despertou repentinamente. Levantou-se, ficando sentado ao lado do seu amor. Olhava para ela. Inundava-a uma beleza única.
A beleza que criara, novamente: não aquela que o mandavam apreciar, na sociedade. Não aquela beleza falsa. Não aquela beleza impossível. A sua beleza. A beleza que nascera com ela. A que a torna única. Os defeitos, que nela conjugados, formavam a própria perfeição.
A cara, de olhos com uma linha quase melódica, que agora estavam fechados. Mas ele já os tinha decorado: eram de um azul profundo, poderoso, que parecia não acabar ali. Parecia continuar até algures… Era um azul escuro que, à medida que se aproximava da pupila, se tornava mais claro, para se transformar num amarelo enérgico, intenso – como o Sol a brilhar num céu limpo. O nariz era proporcional, perfeitinho. Os lábios pequenos e apetitosos. Era dificílimo fitá-los sem neles se perder com um beijo. O pescoço era alto, esbelto, suave… A pele pálida, fresca, mas acolhedora.


Filipe Dumas, 29 de Julho de 2009

Eremita V

To be continued... (:

2 comentários:

Unknown disse...

nariz "perfeitinho" e lábios "pequenos e apetitosos"... :)

humm

este eremita é eremita(s)!!
gosto da forma como os dois são um, e o 'um' tão bem inundado e inserido no outro.

Um abraço e um pedido de desculpas pela longa ausência! ;)

caroline disse...

"Os defeitos, que nela conjugados, formavam a própria perfeição."
flip flip, como isto me lembra as nossas conversas! devia mesmo agradecer-te por tudo :)
estou a ler isto com muita atenção. continua, continua!